“Quando
Jesus estava junto à descida do monte das Oliveiras, toda multidão de
discípulos começaram, alegres, a louvar a Deus em voz alta, por todos os
milagres que tinham visto. E diziam; ‘Bendito seja aquele que vem como rei, em
nome do Senhor! Paz no céu e glória no mais alto do céu.’ No meio da multidão,
alguns fariseus disseram a Jesus; ‘Mestre, manda que teus discípulos se calem.’
Jesus respondeu; ‘Eu digo a vocês: se eles se calarem, as pedras gritarão.” Lc.
19,37-40.
Aos homens e
mulheres de boa vontade, aos animadores, catequistas, articuladores das
Pastorais, Padres, religiosas, religiosos e Diáconos da Diocese de Crateús;
Às autoridades e
órgãos governamentais e não governamentais.
Reunidos em Assembleia Diocesana de
Pastoral em Tauá, de 21 a 23 de março deste ano, recolhemos e refletimos sobre
o diagnóstico da situação da seca realizado em cada município referente aos
anos 2012-2013.
Com a presente apreciação constatamos
que a realidade vivida no dia a dia levanta muitos gritos e pede a abertura de
coração por parte de quem quer ser discípulo de Jesus, que chamou a si todas as
pessoas cansadas e fatigadas para que encontrem alívio.
O grito por água
de beber:
·
A
quantidade de água é insuficiente para o abastecimento humano e a qualidade da
água distribuída é duvidosa;
·
A
cobrança feita pela CAGECE ou SAAE da água fornecida em quantidade e qualidade
não correspondem aos contratos assinados;
·
A
especulação das construtoras de novos bairros que vão inchando as periferias e
abrindo novos loteamentos, quando o sistema de abastecimento de água e de
esgoto não tem condições de sustentar os imóveis atuais;
·
Existência
de reservatórios construídos com recursos públicos e submetidos ao controle e
usos de particulares;
·
Águas
poluídas ou contaminadas sendo consumidas pelos educandos nas escolas;
·
Comercialização
indiscriminada de água sem considerar o potencial disponível dos lençóis
subterrâneos (Poranga e Ipueiras);
O grito pelo
criatório:
·
Parte
significativa do rebanho, sobretudo Bovino já foi dizimado e os que restam (Bovinos,
Caprinos, Ovinos, Abelhas) estão perecendo pela falta de água e pastagem,
obrigando a vender parte do que ainda resta para sustentar o que sobrou;
·
O
milho da Conab Chegou em quantidade insuficiente e sua distribuição foi
desorganizada;
·
A
forragem nativa como o mandacaru, xique-xique, palmas e as vazantes de capim
estão quase consumidas e a compra de rações ou forragens torna impossível
continuar com as criações.
O grito por
sementes:
·
Anos
seguidos com pouca produção fizeram com que as famílias perdessem as sementes
tradicionais;
·
As
sementes distribuídas pelo governo não substituem as tradicionais, são
impróprias ao nosso semiárido, não sendo aceitas pela cultura dos povos do
sertão;
O grito por
saúde:
·
A
alimentação deficiente e contaminada de agrotóxicos, a água de má qualidade, a
saúde pública precária e a falta de medicamentos e exames preventivos, tornam
as pessoas mais fracas e expostas às doenças e enfermidades;
O grito de quem
vai embora:
·
Muitas
Pessoas, sobretudo os jovens desistem do campo, passando a inchar as periferias
das capitais e de cidades do interior; outras famílias são despedaçadas, quando
maridos e filhos vão para o corte de cana, para o trabalho com o gesso,
crediários, as lanchonetes... Empobrecendo nossa região das forças mais novas,
mais ativas e mais inovadoras em troca de pequenas remessas de dinheiro;
O grito de quem
está fora dos programas sociais:
·
Muitas
famílias estão fora dos programas sociais por falta de uma Reforma Agrária
efetiva e verdadeira, não têm casa para terem direitos a uma cisterna, não têm
documentos para terem acesso ao cartão cidadão, comprometendo o direito a
aposentadoria e nesse tempo tem menor possibilidade de contar com a
solidariedade da grande família que está enfraquecida pela seca;
O grito pela convivência no semiárido:
·
O
processo para aprender a conviver nesta terra semiárida, nossa amada terra
prometida, anda lentamente;
·
São
poucos os municípios que encaminharam uma contextualização da educação. Existe
somente uma EFA (Escola Família Agrícola) na região, economicamente não
assumida pelo poder público;
·
Isoladas
experiências de captação de água de chuva e de irrigação; quase inexistentes a
produção de forragens e ensilagem;
·
Não
temos reflexão sobre o jeito de planejar, construir e viver no meio urbano, em
harmonia com nosso clima e nossas riquezas naturais;
Como resposta a
esses gritos nossa Diocese se compromete a:
·
Assumir
essa realidade no cotidiano de nossas atividades litúrgicas, catequéticas e
pastorais.
·
Revitalizar
as Casas de Sementes onde existem e animar o processo de criação onde ainda não
tem;
·
Fazer
campanhas para adquirir sementes tradicionais que reabasteçam essas casas.
·
Motivar
e apoiar mutirões e ações comunitárias para recuperar poços, cacimbões, olhos d’água
e fazer a limpeza dos açudes, beira dos rios, cisternas...
·
Multiplicar
as Escolas Camponesas, apoiar as EFAS (Escola Família Agrícola), implementar a
educação contextualizada em nossos municípios;
·
Apoiar
as reivindicações dos trabalhadores (as) (Reforma agrária, saúde, alimentação
de qualidade, etc.) junto aos governos municipais, estadual, federal, CAGECE, SAAE,
CONAB, BNB e demais instituições;
·
Reestruturar,
a nível paroquial, a Comissão Pastoral da Terra, revitalizar o Fórum de
convivência com o semiárido, Fórum dos assentados, Associações Comunitárias e
qualificar a participação nos conselhos municipais;
·
Repensar
os tipos de criações adequados para o semiárido e a maneira de alimentá-las
adequadamente em qualquer situação;
·
Inserir
a leitura e discussão do conteúdo desta carta nos meios de comunicação, nas
assembléias, encontros e reuniões e em todo processo educativo de convivência
com o semiárido.
Assim como Jesus entrou em Jerusalém com
os mais pobres para celebrar a Páscoa e doar sua vida em plenitude, por amor ao
Pai e fidelidade ao Reino e aos irmãos, enfatizando que “se eles se calassem as
pedras gritariam”, queremos nos fazer companheiras e companheiros das
trabalhadoras e trabalhadores do semiárido nesta situação de morte e vida que
estamos atravessando, em defesa e rumo à vida plena conquistada por Jesus em
conseqüência de sua missão, martírio e Ressurreição.
Tauá, 22 de março de 2013